O HOMEM MAIS RICO DE TODOS OS TEMPOS ERA AFRICANO
Escrito por REGINALDO DOS SANTOS AURESLINO em 03/07/2017
O rei africano Musa Keita I é considerado a pessoa mais rica da história. Segundo a revista Time, Musa é "mais rico do que qualquer pessoa possa descrever."
Considerando que Augusto César, o imperador romano, que, segundo a Time, é a segunda pessoa mais rica da história com patrimônio estimado em US$ 4,6 trilhões, então a fortuna de Musa Mansa, como Musa Keita I ficou conhecido após tornar-se rei, era impressionante.
"Realmente não tem uma maneira de mensurar com precisão a riqueza de Mansa Musa", disse Jacob Davidson da Time.
Mansa Musa governou o Império do Mali no século 14 e seu território era abundante em riquezas naturais - com destaque para o ouro.
Musa Keita I assumiu o poder em 1312. Ele assumiu o título de 'Mansa', que significa 'Rei'. Ele expandiu de maneira exponencial as fronteiras de seu território - totalizando um domínio sobre mais de 3.200 km.
Seu império controlava os territórios dos países que atualmente são a Mauritânia, Senegal, Gâmbia, Mali, Guiné, Burkina Faso, Níger, Nigéria e Chade. Considerando as atuais escalas, ele dominava um território que compreende nove países.
Sua imensa fortuna ficou famosa quando, em 1324, Mansa Musa fez a peregrinação de quase 6.400 km até a cidade de Meca, na Arábia Saudita. O Rei não poupou despesas na viagem. Sua peregrinção à Meca era composta por dezenas de milhares de soldados, civis e escravos. Além de 500 arautos que carregavam, junto de diversos camelos e cavalos, muitas barras de ouro.
Ao passar pela cidade de Cairo, no Egito, Mansa Musa doou tanto ouro e dinheiro que gerou uma crise inflacionária na cidade, desvalorizou o ouro.
Mansa Musa governou por 25 anos até falecer em 1337, mas deixou um enorme legado de mesquitas, escolas, bibliotecas e museus que persistiu por muitas gerações.
Musa era sobrinho-neto de Sundiata Keita, que havia fundado o Império pouco menos de 80 nos antes. Por muçulmano, embora vinculado ao islamismo com face africana, resolve, em 1324, cumprir um dos cinco pilares de sua religião: a hajj, que determina que o crente adulto e sadio deve visitar Meca pelo menos uma vez na vida.
Isto porque, possivelmente, já os outros quatro pilares – a submissão incondicional a Allah, a esmola dada aos pobres, o jejum durante o Ramadã e as cinco rezas diárias – é de se supor que, certamente, já vinham sendo constantemente executados.
Portanto, é com o intuito de cumprir o pilar que faltava que o Imperador se destina a Meca; e para isto, leva consigo, segundo contam fartas testemunhas da época e historiadores vários, tais como Ibn Batutta, algo, no mínimo, suntuoso:
. 60.000 homens;
. 12.000 servidores, vestindo seda e portando vasos com ouro;
. 80 camelos, carregando entre 50 e 300 quilos de ouro em pó, cada um;
. 500 servas, trazidas por sua esposa sênior, Inari Kunate.
Havia, ainda, incontáveis cavalos, selados ou portando ouro, além de bandeiras e arautos ricamente vestidos, exibindo pompa muito maior que a ostentada por todos os seus antecessores em viagem a Meca.
Esta viagem, segundo ainda historiadores da época, durou, pelo menos, um ano, posto que o Mali alcança o Atlântico, e Meca está na Península Arábica: portanto, foi preciso atravessar toda a África, do ocidente ao oriente, para ir além do Mar Vermelho.
Na passagem Musa, seguindo o rio Níger, visitou diversas cidades importantes: algumas, eram pujantes entrepostos de caravanas e centros de comércio na África Central, para onde a comitiva atraiu comerciantes de tão longe quanto Maiorca e Egito, além de pessoas comuns, incluindo judeus e, logicamente, muçulmanos.
Já no Egito, enviou um presente de 50.000 dinares ao sultão, mesmo antes de decidir-se a permanecer, por lá, por três meses. O sultão, em retorno, lhe emprestou o palácio de verão, certificando-se que sua comitiva fosse muito bem tratada.
Ali no Cairo, assim como durante toda a viagem até a Península, veio ele sempre negociando e doando ouro, em pó ou não, por onde transitava; de tal generosidade, aproveitaram-se os comerciantes egípcios, que passaram a vender seus produtos com algo em torno de 500% de aumento, o que, segundo é contado, desvalorizou de tal forma a moeda egípcia, por conta da inflação assim provocada, que a economia local não conseguiu recuperar-se durante, pelo menos, os próximos vinte anos!
De volta ao Mali, Musa soube que Sagmandia, um de seus generais, havia recuperado a cidade de Gao, que tinha sido centro de império e de comércio; de posse desta notícia, ele resolveu desviar-se da rota original, visitando a cidade reconquistada, onde recebeu, como reféns, os dois filhos do rei de Gao, Ali Kolon e Nar Suleiman. Com eles, retornou à sua capital, passando a educá-los em sua corte.
Aliás, neste retorno, Mansa Musa trouxe, consigo, muitos estudiosos árabes e arquitetos; inclusive o andaluz Abu Es Haq es Saheli, a quem, segundo consta, pagou 200 kg de ouro para construir a suntuosa e imponente mesquita Djinguereber, em Timbuktu! Assim iniciou o estilo sudanês de construção, de adobe e madeiras.
Portador de tanta pompa, pode-se assumir que Mansa Musa foi responsável, em grande parte, pela expansão do Islã no norte da África Negra, por onde espalhou madrassas, como são chamadas as escolas muçulmanas. Fiel a esta confissão, também trouxe, em seu retorno ao Mali, quatro descendentes do Profeta, para que o país fosse “abençoado por suas pegadas.”
Mas, não só de religião viveu o reinado deste impressionante imperador africano: também a expansão e consolidação do império a ele devem ser creditadas.
Foi por suas mãos, ou melhor, durante seu reinado, que o Mali que, antes, se limitava aos territórios do antigo Império de Gana, à região de Melle e circunvizinhança, também dominou Koumbi Saleh, Djenée, Futa-Djalon e, entre outras cidades, a já mencionada Gao, dando, ao Mali, seus contornos finais. Nestes novos contornos, abarcou o pequeno reino de Kukia que, ironicamente, nunca mais sairia da história do Mali.
Com esta expansão, este impressionante império passou a controlar minas de ouro extensamente produtivas, além de ricas rotas de comércio, que se estendiam do Egito ao Marrocos, o que lhe permitiu forte incremento nos negócios, que envolviam, além do ouro, marfim, sal e produtos diversos.
No auge do poder, o Império continha, pelo menos, 400 cidades, quase todas densamente povoadas. Mansa Musa também investiu fortemente na educação: em seu governo, determinou a construção ou revigorou as universidades de Timbuktu, Sankore, Djenée e Ségou que, atraindo estudiosos de todo o mundo muçulmano e indo muito mais além, espalhou o Islã através dos mercados, fazendo de Timbuktu prestigiada área de pesquisa, estudo e produção acadêmica, para onde afluíram não só doutores da lei islâmica como, também, historiadores, astrônomos, filósofos, matemáticos e intelectuais outros, diversos.
Além disto, também passou a apoiar artistas e eruditos que, atraídos pelo potencial do Império, não demoraram a chegar, estabelecendo-se por lá. A fama do país, ancorada em sua pujança, bem como a de seu governante, assentada em sua generosidade, capacidade administrativa e habilidade econômica, acabou por viajar por todo o Mediterrâneo e sul da Europa, onde comerciantes de centros dinâmicos tais como Gênova, Veneza, Granada, logo acrescentaram Timbuktu a seus mapas de viagem, aí incluindo seus mercados e rotas de comércio, onde trocavam bens por sal, marfim e ouro, entre outras especialidades.
Esta pujança, evidentemente, carreou para o Mali tamanha fortuna que Mansa Musa é, hoje, considerado o homem mais rico que a humanidade já viu: segundo relação elaborada pelo site CelebrityNetworth.com em 2012, que inclui as 25 fortunas então consideradas as maiores de todos os tempos, Musa, em valores atualizados, disporia de algo em torno de US$ 400 bilhões, o que é superior ao dobro da fortuna de Bill Gates, o único listado então sobrevivente entre os 25 que o site relaciona!
Portanto, é um africano, competente administrador público, altamente letrado, mecenas, fortemente religioso, que viveu no séc. XIV e foi imperador do Mali, o detentor da maior fortuna que o mundo já viu!
Este fato contraria, indubitavelmente, todo o discurso de apoio ao escravismo moderno que, um século depois, passou a afirmar que os africanos não tinham instrução ou deus, sendo incapazes de civilizar-se ao largo da tutela europeia.
Note-se que de tanta riqueza dispunha Musa, que Abrão Cresques, autor do Mapa Catalão de 1375 – portanto, apenas cinquenta anos após a hajj deste Imperador – ali o retratou com uma pepita de ouro nas mãos, um mercador árabe se aproximando montado em um camelo, e a cidade de Timbuktu, então capital do Mali, a seus pés.
Como resultado, talvez não se mostre exagerado imaginar que este mapa tenha levado o Infante D. Henrique a associá-lo ao Preste João, cuja lenda, à época, corria a Europa, afirmando haver um poderoso rei, nas Índias, Arábia ou Etiópia, ao qual o Infante talvez tenha imaginado juntar-se para bloquear o que acreditava ser a fonte de financiamento dos muçulmanos que, então, ocupavam a Península Ibérica; e aos quais o Infante dedicava interminável guerra.
Se assim é, talvez tenha, esta crença, levado o Infante a determinar, em 1436, que seus navegantes cruzassem os cabos Branco e Bojador em direção à África, dando início, por desdobramentos outros, ao lamentável processo que culminou com a implantação do escravismo moderno a vitimar africanos, com efeitos altamente perniciosos sobre sua descendência, que ainda perduram, mais de meio milênio depois.Prosseguindo: o reinado de Mansa Musa durou 25 anos; ao final deste período, ele foi substituído por seu filho Maghan I, que acabou deposto, em meados de 1341, pelo Mansa Suleyman, irmão de Musa.
Era o início da decadência do império que, esgarçando-se em disputas políticas, esfarela-se em pequenos reinos, até ser suplantado pelo Songhai, em 1546.
A ironia final é que o Songhai formou-se a partir do pequeno reino de Kukia, conquistado por Mansa Mansa, conforme acima citado, em 1325, ou seja: no mesmo ano em que voltou de sua portentosa hajj. Qual a ironia? Talvez o Songhai, pouco mais de dois séculos depois de ser conquistado, tenha conseguido se vingar…
Hoje os griots do Mali xingam Mansa Musa por ter dilapidado o tesouro dos Mandingas que os reis anteriores demoraram séculos para juntar.
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